Jornal Pensar a Educação Pensar o Brasil FaE/UFMG
PONTOS
PARA A LÍNGUA PORTUGUESA DO BRASIL: um amor derramado no verbo em transição
_ Português? Eu
amo português!
_ Ah! Sério?
_ Muito sério...
olha! Está vendo? Estou toda arrepiada.
Naquela altura
da prosa ainda não estava certo quanto à fala da enfermeira de um dos maiores
hospitais de Belo Horizonte. A convicção que vibrava em sua voz impactara-me.
Seria uma forma de ironia tão fina que minha percepção não dava conta? Falava
sério?
_ Mas... –
titubeante -, como assim?
_ Eu amo! Amo!
Sempre amei...
_ De onde surge
esse sentimento? – já imaginava uma professora de óculos, gentil alfabetizadora
nos iniciais anos escolares. Óculos, voz suave...
_ Eu amo
advérbios...
_ Então?
_ E os
pronomes...
_ E ... quem..?
_ Amo separar as
frases em orações, começando sempre pelo verbo.
_ É incrível,
nunca ouvi alguém demonstrar tanto amor pela língua mãe.
_ E aquilo que
vem depois do verbo... é... direto e...
_ Objeto?
_ Isso! E... as
orações subordinadas e...
A perplexidade é
a mãe que pare o curioso. Fui parido para dentro daquela onda de encantamento
linguístico ao ponto de ganir assombros. Ai! Au! Ela não me deixava entrar no
turno das falas. Era só amor pela língua portuguesa. O Brasil parecia pequeno
para tanta adoração. Tentei:
_ Estou curi...
_ Eu amo, amo de
verdade. Sempre amei!
_ Estou mais do
que admira...
_ Sempre me saí
bem nas aulas. Sempre!
_ E qual
profes...
_ Eu acertava
todos os exercícios.
Eu já gania
audivelmente, uma vez que, estávamos no ponto de ônibus em frente ao hospital
em referência indireta. Precisava saber. O nome, a escola, uma lembrança que
permitisse rastrear a narrativa. O ônibus... atrasa! atrasa! atrasa! O meu e o
dela. Atrasem... atrase...atrasem...
_ Estou...
_ Amo tanto, mas
tanto que quase fiz graduação em letras.
_ Eu penso que
você deveria fazer agora,... conte... – atrase... atrasem...chove
mais...chove..atrasem...ai!!!!
_ Você acha?
_ Sim! – enfim
uma entrada. _ Sim! Com certeza! Mas conte, por favor, como você se apaixonou
assim pela Língua Portuguesa do Brasil?
_ Como?...
_ É! Como? Quem
foi o professo...
_ Ah! isso!
_ Estou muito
curioso. Também sou prof...de líng....
_ Não foi
professor não, bobo! Foi a vida!
O ônibus da
enfermeira chegou e para mim, iniciava-se o mais profundo silêncio. Respeitoso
silêncio de quem reconhece que, de alguma forma, alguma coisa foi parar no
exato lugar no qual deveria estar.
Ivane Laurete
Perotti
<http://pensaraeducacao.com.br/pensaraeducacaoempauta/>