POR QUE SONHAR?
POR QUE SONHAR?
"Somos feitos da mesma matéria que compõe os
sonhos, e
nossa
breve vida está envolta em sono".
William Shakespeare
Não creio que ter "os pés na lua” seja um defeito. Pelo
contrário, acredito que o mundo seja construído pelos sonhos dos que têm
coragem de sonhar! E não sei se isso é bom ou ruim. Ou se tende a merecer
justificativa.
Quando
nossa alma silencia, penso que ela ouve os sonhos que sussurram entre si, como
se pairassem em algum lugar intocado pela falta de fé. Eles, os sonhos, ficariam
nesse espaço pelo tempo que nosso descuido se encarrega de esquecê-los. Mesmo
os que se dizem com "os pés no chão" visitariam esse espaço. Para nos mantermos humanos haveríamos de promover alguma ligação com as brumas da esperança.
Percebem?
Os meus pés desnudos grudaram na lua desde antes de eu vir para cá... se é que
vim. Então, a realidade é aquela que eu crio de acordo com as minhas
necessidades mais ou menos necessárias, conscientes ou inconscientes.
As brumas da esperança têm criado formas
diversas, assumem vozes diferentes, desenham rostos entre os que passam através
delas.
Queria entender os sonhos todos: os que parecem
bons e os que parecem ruins. Queria entender como eles se desgrudam da forma
subjetiva, imponderável, típica do lugar de onde vêm e se manifestam aqui, onde
acreditamos se tornem reais. Fomos “acostumados” a pensar que os sonhos, por si
só, têm uma conotação altruística, construtiva, benigna. Mas a ordem do que
parece real no espaço das manifestações tem raízes que não se expõem. E sonho é
matéria imaterial: ganha raízes que se
plantam boas ou prejudiciais.
O quê podem sonhar as crianças nesse comum
espaço humano denominado obrigatoriamente de sociedade? Talvez, consigam sonhar
de acordo com o quê a idade lhes mostra, com o quê a vida lhes traz, com o quê pensam
que é de verdade e o que acreditam não ser; sobre o que nunca viram, mas
desejam criar. As crianças também podem estar com os "pés na lua" e a cabeça aqui, encostada em um lugar concreto
demais para os sonhos que as acompanham.
Algumas crianças sentem mais do que outras: almas sensíveis debatem-se entre os
muros erguidos pela necessária e imperiosa ordem do crescimento inevitável. Doutrinam-se
ou deletam-se os sonhos bons como prévio
sustentáculo para o quê vem à frente no espaço da experiência diária, na qual,
os sonhos bons estão perdendo
para os maus sonhos ou para os sonhos
inexistentes.
Ausência de sonhos cria vácuos que
desenterram pesadelos. E estamos nos preparando cada vez mais para eles.
_ Não sonhe, meu filho! A vida é feita de
fatos reais.
_ Não sonhe, meu filho! Você precisa enfrentar
a realidade!
_
Não sonhe, meu filho! A vida é dura e cruel.
_ Não
sonhe, meu filho! Você precisa ser forte!
_ Não
sonhe, meu filho! Você precisa crescer!
_
Não sonhe, meu filho! Quem sonha sofre, e não chega a lugar algum!
A ordem letal é: ENDURECER!
MATAR OS SONHOS PARA QUE CONTINUEM CAINDO SOBRE AS NOSSAS CABEÇAS EM FORMA DE
BALAS PERDIDAS, BALAS DIRIGIDAS, DROGAS PERMITIDAS, DROGAS ESCONDIDAS. Que
sejamos cada vez mais FORTES diante do pesadelo de estarmos humanos. ENDUREÇAMO-NOS
para continuar vivendo com os pés na rua, na terra crua, longe de qualquer
sonho de evolução.
Enterramos
a humanidade e a sensibilidade desce ao mesmo túmulo, pisoteada pelo medo que
faz sofrer antes do sofrimento chegar. Estamos preparados para a “demanda” do
choro que explode nos pesadelos marinados em caldos de realidade, para as
explicações comportamentais, para as teorias antropológicas que definem o homem
enquanto homem e ser animal; estamos preparados para carregar flores e velas,
vestir camisas brancas, escrever cartazes comoventes, chorar em público, dar as
mãos.
Estamos preparados para o resultado acerca do
que criamos enterrando cada vez mais fundo a sensibilidade, essa farpa
condicionada à realidade dos que sonham e que deve, precisa, urge!, seja delegada à extinção. Sentir é deixar
espaço para as manifestações que se desqualificam diante da razão. E ambas,
razão e sensibilidade, parecem definir espaços tridimensionalmente distantes,
impróprios, distintos e imponderáveis nas ondas de experiências que o homem luta
para levar a contento. Ou uma ou outra. As duas “coisificaram-se” em ideias e
conceitos distantes que atrasam as previsões para os pesadelos que não vêm a
cavalo. Chegaram. Estão aí. Somos afogados por eles sem que a lucidez nos
atinja em um único rasgo de sanidade.
Sonhos bons
são redondos e desconhecem limites quadrados, angulosos, determinados. Sonhos bons são fluídos e tocam, contagiam,
empolgam, iluminam. Deveriam tornar-se programa obrigatório nas escolas, na
vida, nas calçadas, nas ruas.
Os sensíveis não são
lunáticos, a não ser na visão dos enterrados em si mesmos. E eis aí, aí mesmo,
o endereço do túmulo pisoteado.
Por que sonhar?
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