APUPOS

DIALÉTICA DO PODER
                     -  dual é o caminho das pedras -
                                           "Todos os Estados bem governados e todos os príncipes
                                                 inteligentes tiveram cuidado de não reduzir a nobreza ao
                                                 desespero, nem o povo ao descontentamento."
                                                      Maquiavel
  
                                           Sobre a pedra metamórfica, descansam o sapo e a codorna. Um, munido de longas pernas, o outro, recoberto de lanugem adulta. Para o primeiro, a língua comprida diminui o esforço aparente; quanto ao segundo, a camada de penas  cumpre dupla função: maquia e identifica a maturação. Sexualidade é tempo fértil, modus operandis, aumento da criação.
                                           O sapo espera o transeunte  voador em descuido de jornada; a codorna, domesticada, aguarda pacientemente que se lhe sirvam a industrializada refeição. No habitat do anuro, a desova ocorre ao natural, enquanto o exemplar da família dos galiformes, reproduz-se em escala comercial, facilitadas as condições em lucrativas criadeiras.
                                          A pele rugosa do Bufo Marinus afasta os olhares mais sensíveis à repelência. A penugem da Coturnix Coturnix  em cativeiro é um "fofo" incentivo para o quadro abundantemente rápido de sua engorda: 30 dias vão-se, aproximadamente, entre o nascimento e a extração. Vender é preciso!
                                         Ovos galados? O anfíbio tem ciência sobre a preservação dos zigotos: a umidade lhes é salutar. O bípede descendente dos répteis, possivelmente dos dinossauros, depende do calor em ambiente seco para a sobrevivência dos filhotes classificados. De um lado os machos, de outro, as fêmeas: gaiolas climatizadas, vacinas, manejo higienizado. O produto tem mercado!
                                    À deriva, entre os limites da aceitação de um e outro, a gastronomia determina quem serve a quem: o sapo, indigesto, não alçou ao gosto apurado das receitas à provençal ( nádegas de rãs configuram especiarias bem pagas no topo dos menus refinados); as codornas, embebidas em vinho tinto ou assadas na companhia cítrica de bojudas  laranjas maduras galgam o status da persuasão culinarista: gosto não se discute. Política, também! Também, vírgula! Sendo que, tanto a política quanto a vírgula dependem da flexão intrínseca ao poder destilado pela articulação verbal. Ah! Frases de doer... quando a palavra não transporta intenção? Animus Necandi : generalizar é um recurso que deixa a retórica em "papos de aranha",  com " papas na língua" e sem direção ( famosa alusão à capacidade humana de "atirar para todos os lados").
                                     
                                       O caminho das pedras se faz pela soma das tensões. A submissão de alguns é a transformação de outros: pedras são pedras aqui e no Japão, guardadas as condições de temperatura e pressão. Não?
                                      Corte! Corte! Corte! na  corte do imperador O cisalhamento, resultado de forças iguais ou opostas, tem direções semelhantes, mas apresenta intensidades diferentes, igual e comparável ao processo de nossas campanhas para a eleição de um líder maior. Governa-se o governo governado: votação?!
                                       Sob o sapo e a codorna brota  uma rocha com elevada capacidade de atrito, conflito, apuros em transformação: apupos, corriola, gritos, consternação fazem parte da contenda, mesmo que jamais se entenda que, no poder, impera a dialética da vez. Algo conforme a fome e a vontade do freguês. Quem sabe... será desta vez? Na mira do prato, há patos, Bufo Marinus  e Coturnix Coturnix. Culinária?
                                       
                                                 "Quando as aves falam com as pedras e as
                                                   rãs com as águas - é de poesia que estão
                                                     falando!"

                                                                    Manoel de Barros
Texto: Ivane Laurete Perotti

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