O AMOR E O... AMOR!
NEM
SEMPRE A EXPERIÊNCIA BASTA
- quando
a falácia do comportamento desnuda a insustentabilidade do amor-
"O
verdadeiro amor é uma expressão da produtividade interna e compreende
solicitude, respeito, responsabilidade e conhecimento." Erich
Fromm
Na varanda
da vida, um homem esperava entender a
suspensão das estrelas na
massa escura que
forrava o céu por sobre a sua cabeça. Braços estendidos,
acreditava tocar a borda do espaço aparentemente imutável. As mãos sedentas desenhavam os contornos das
pontas luminosas e retornavam vazias para o colo nu. As esferas de plasma não o
convenciam a desistir da empreitada: interpelava as estrelas como se questionasse a própria
existência. Ao sabor da pesada solidão creditava ao destino, às perdas, às inadiáveis
partidas, o gosto ácido que lhe penetrava a boca e teimava grudar-se às paredes
da alma.
O homem pendia nos limites da varanda: queria
dançar uma vez mais nos braços da poesia; desejava sorrir para o espelho dos
olhos que lhe faltavam e faziam a saudade transbordar em lágrimas secas. Queria
falar nada no silêncio das conversas
conhecidas, beber da mesma taça o vinho entornado no descuido dos lábios
entreabertos, rir do chiste incompleto, jurar as promessas adiadas, solicitar o
perdão escondido nas mangas do puído pijama: clamava às mãos da noite o afago
derradeiro.
As estrelas não
confessavam, mas o homem entendia a linguagem da partida; urgia apenas que
traduzisse em bênçãos o discurso da permanência. Em vida, a vida
lhe presenteava com imponente gratidão, mas esta não bastava às evoluções de
seu velho espírito imaturo: queria ouvir das estrelas que denunciassem a
solidão que acreditava amargar. O presente
não lhe chegava à consciência empanada. Corria por suas lembranças suposta vingança pelo abandono da felicidade:
coubera-lhe uma fatia de
responsabilidade não esperada. Que se lhe descesse do céu o direito à luz e ao
calor, ao abraço e à parceria, ao amor e à comunhão. Que se lhe descesse do
céu...
Na varanda da vida, os olhos perdiam o que não
souberam cuidar; enquanto os corpos celeste despediam-se, apenas uma
estrela observava do outro lado da noite
e ela já não estava a chorar. Estrelas nascem, evoluem e morrem sem deixar
pegadas visíveis ao olho despreparado; em galáxias sem prévio registro há passagens
para as lágrimas humanas, há portais para os beijos apaixonados e balaustradas
de energia que não se esgota.
O homem universal cria histórias e fia que sejam reais. Pelas órbitas de todas elas imprime rastros
mais ou menos luminosos, mais ou menos consistentes, mais ou menos palpáveis. Na eterna impermanência, homens e astros comungam de relativa interação entre os corpos que os constitui: relativa e insustentável
aproximação do que parece concreto e do que se mantém "real".
Imperturbável às provas de
refutamento e negação, atrás do pó das
estrelas ou no vazio saliente que a
lembrança delas expande, um sentimento sobrevive na berlinda da vida e beija as
varandas obsoletas: o amor, nada mais
além dele.
" O amor imaturo diz: eu te
amo porque preciso de ti. O amor maduro diz:
eu preciso de ti porque te amo". Erich FrommTEXTO: Ivane Laurete Perotti