TEXTO JORNAL PENSAR A EDUCAÇÃO, UFMG/FaE
UMA
ESCOLA A DESCOBERTO: UM PAÍS À DERIVA
_ Professora...
pode me dar um abraço?
_ ... com certeza!
_ Professora, quero
lhe pedir algo.
_ Estou ouvindo!
_ Por favor! Não
desista de nós. Eu preciso de você! Ouviu? Eu preciso de você! E eles não sabem
ainda... mas também precisam.
(Diálogo
entre um aluno do 1º ano do Ensino Médio, escola pública de BH, e a sua
professora cansada.).
Neste país de
tantos reclames, desconhecemos a escola pública que se pratica. Aos pedaços,
sujeitamo-nos às repetições em nome de “mais do menos” e caímos no
despenhadeiro dos falatórios: ruídos da sujeição.
Sem projeto, sem
ambição, sem lastro para ações pedagógicas protagonistas, assistimos o ocaso de
uma potência imberbe. A escola pública no Brasil não saiu do espaço das especulações
desencontradas. Enquanto isso, aprendentes invisibilizados abarrotam as filas
da exclusão social, professores desacreditados respiram a fórmula do demérito
planejado: quanto menor o investimento no profissional da educação, maior o
bolsão de despreparados. Quanto mais a escola desconhecer o sistema que a
amarra em berço nu, menor a capacidade de pensar o Brasil. Quanto mais jogarmos
a responsabilidade no aluno e no professor, menos conheceremos a complexidade
dialógica das relações que caracterizam o universo da educação. Qual é a escola
que queremos? O que se entende por escolarização do conhecimento?
“Professora... pode me dar um
abraço?” Ação benefactiva, conforme Filmore (1977), na qual a experiência
beneficia os sujeitos envolvidos. O abraço é
conteúdo da afetividade, um dos pilares da aprendizagem, marco da sabedoria
precoce, tradução de múltiplas linguagens e, aqui, prova de uma constatação
irrefutável: roto, esfarrapado, o profissional da educação respira debaixo
d’água por guelras de expectativa. Sem equipamento de mergulho, toma para si a
responsabilidade de vencer a correnteza. Sem crédito, soçobra lentamente. Até
quando?
A professora, envergonhada
por se deixar apanhar em momento tão íntimo, pensa que investiu na profissão
errada, que a sua formação não a preparou para aquele quadro, que os anos pela
frente são turvos e inseguros, que “eles” não sabem ainda... e talvez jamais
venham a sabê-lo! Termina a aula com a troca do abraço e ganha um átimo de
fôlego para pensar se voltará no outro dia. Voltará?
_ Por favor... não desista de nós!
O ablativo da frase latina Mea culpa mostra a sua face
fantasmagórica: monstro da servidão, toxina da alma, moeda do capital.
Mea-culpa! Mea-culpa! Mea-culpa!
Referências:
FILMORE, C. J. A semântica na linguística moderna: o
léxico. Tradução de
Lúcia
Lobato. Rio de Janeiro: Editora Francisco Alves, 1977.
Ivane
Laurete Perotti