UMA TRISTE FOTOGRAFIA
UMA
FOTOGRAFIA DO BRASIL: O VALOR DA VIDA HUMANA
“Quando, sorrateiramente, sigo
quase sem poder respirar, os macacos, os tucanos ou as pequenas aves nas matas,
naquele momento entro em contato com o essencial significado da vida. Isso
realimenta o meu espírito e dá sentido à minha existência.”
Luiz Cláudio Marigo
Um
homem sensível tomba.
Verga o peito carregado de emoção e sabedoria
no assoalho de um ônibus urbano. Urbana cena, não fosse a insensatez que se
deflagra no transcorrer do quadro urgente. Gestos desesperados buscam socorro: “O
papel dos fotógrafos é despertar a consciência do homem para a incrível riqueza
da vida na Terra, sua beleza e valor espiritual.” No corredor do
ônibus, os olhos que viram o mundo pelas lentes do amor e do respeito, procuram
pelos olhos que lhe poderão acudir na hora em que a vida depende do
conhecimento e da boa vontade.
Se a solidariedade voluntária bastasse para manter-lhe
a vida, o coração de Marigo estaria vibrando com o carinho angustiado de tantas
mãos desconhecidas. Socorristas do acaso bateram às portas do lugar onde a
medicina tem o privilégio de processar a cura, ou pelo menos, tentar alcançá-la.
Desconheciam eles, cidadãos em trânsito que, além das palavras, as instituições
brasileiras perdem o poder de referendar o que significam. Instituto Nacional
de Cardiologia: desmotivados e inertes, não traduzem o pedido de socorro por
uma simples questão retórica: quanto mal está aquele que está mal? Quem deveria
dar a resposta usa-a como aríete de defesa indefensável. “Passar mal” é jargão
popular e não mobiliza a consciência, os braços e outras partes inertes
daqueles únicos capazes de fazer a leitura correta. Quanto mal? Muito mal?
Pouco mal? Mais ou menos mal? O sensível coração do fotógrafo da natureza
bombeia a gentileza genuína dos que lhe confortam na espera vã. Descaso.
Desrespeito. Vergonha inominável vem do único lugar que legitimamente poderia atendê-lo.
Lugar errado? Hora errada? “Minhas
fotos são dádivas que a natureza me oferece. Por sua vontade, o animal me
espera, a luz brilha na hora certa, as flores abrem-se para a fotografia.
Preciso apenas reconhecer sua beleza e estar no lugar e no momento certos para
registrá-la...”
Lágrimas cobrem o corredor
do ônibus. Pudessem antes ser coloridas pela bondade consciente de um homem que
decidiu ver o mundo e mostrar o melhor do que via. Pudessem ser mornas e
aconchegantes como os seus movimentos no meio da natureza selvagem. Pudessem
ser lágrimas de aplauso por uma vida inteira dedicada a salvar e construir uma
consciência em absoluta degradação: quanto vale um gesto em favor da vida?
“Espero
que o meu trabalho transmita a mesma alegria e emoção que sinto nos ambientes
selvagens e que as minhas fotografias não se transformem apenas em mais um
documento do passado.”
Ah! Grande e doce fotógrafo, vale
pedir-lhe perdão pela selvageria humana que lhe negou um lenitivo? Sim, talvez
fosse o seu momento e a sua hora, mas se diante deles você nos deixasse uma
fotografia colorida, as lágrimas de dor não cavariam tão fundo, tão fundo o
poço que nos registra ignóbeis e insensíveis na cátedra da negação instituída,
fundada e instalada. Mais médicos? Não! Mais consciência! Mais dedicação, mais
valor à vida.
Em plena luz do
dia, a escuridão fétida de um sistema de saúde caótico expõe uma vez mais as
fotografias do Brasil: verde e amarelo? Ora! ...Uma casa para o coração doente
deste país que não bate no peito, mas fica na saudade fértil de que, um dia,
talvez um dia voltemos à nossa origem mais humana, menos profissional.
Ao fotógrafo da
vida, a VIDA ETERNA!
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