TAXAS DA CONSCIÊNCIA

PEDÁGIO PARA O AMOR E A LIBERDADE

- direito de passagem no ritmo da vida concessionada -

"A prisão não são as grades, e a liberdade não é a rua; existem homens presos na rua e livres na prisão. É uma questão de consciência."
Mahatma Gandhi

                                Olhos fechados não sentem o estrago da poeira na via deserta, mas conferem verdade ao simulacro da solidão que   sustenta a  pávida debilidade da covardia. Ao forte, a morte da ignorância; ao débil, a sobrevivência inglória na multidão vazia. E assim caminha o homem no espaço criado pela limitação de seu desbotado conhecimento: carcaças desprovidas de alma afinam o prumo... inúmeros corpos vazios trilham o rumo, sem lume, vão para lugar nenhum.
                              Povoar a consciência requer vontade e escolha: dois vórtices em  ângulos afilados pela política da concessão. Concede quem aceita o acordo não lavrado no cartório dos "avisados" - contrária lei da legalidade.  Ao passante da vida comum cobra-se o pedágio para o amor e a liberdade, esquina entre a Rua do Contrito com a Avenida do Pecado: falso endereço da felicidade. No amor, o mito - aflito pedido na outorga imatura concedida de fora para dentro  (doentia  ilusão do falso mergulho nas escuras e gélidas águas da superficialidade ); na liberdade, a ausência do grito - outro mito, atrito invertido na ordem do reclamante,  ainda mais ausente na demanda por emancipação. Ilusão sobra ilusão no descarado acúmulo de transferências: minha máxima culpa é  passe cobrado pelo poder de barganha pessoal diretamente ligado à capacidade de compreender os sentidos de valoração e a valoração dos sentidos. Falar não é delito, mas acusa o acusado em franca transgressão. Deixar de dizer é morrer em vias de sangue corrente, sentido ausente à vontade de viver.
                             Escondem-se ou substituem-se os sentidos não arguidos? Simulacres et Simulation, de Jean Baudrillard (1981) é um interessante, divertido ( poético?) e irônico tratado sobre a realidade, os símbolos e a sociedade,  no qual o autor discute a contemporânea experiência humana. O sociólogo francês não se fez ressarcir das polêmicas e controvérsias levantadas. Afirma na obra que a realidade deixou de existir pela força e peso dos símbolos, e chama de  "simulacros" as simulações malfeitas do real,  muito mais atraentes aos olhos do espectador do que a própria realidade. Baudrillard "tomou" o bonde da sanidade  e assentou-se em meio aos terrenos trilhos da existência moldável. Viveu!
                        Então, pagar pelo "direito de passagem"  exigido no percurso das  vias de nossas experiências é uma "fria" ou um "investimento"? Quando um investimento deixa de ser uma fria? A pergunta têm endereço geopolítico e adere à conjuntura cultural: amor e liberdade armam-se de arames mais ou menos truncados na blindagem da consciência. Unir ambos é uma equação de múltiplas variáveis e discutíveis resultados. A matemática não se faz exata nas conversas de lábio aberto. E o lugar  da poesia perde abrigo quando as "farpas" do vazio aparente - só aparente, uma vez que o vazio preenche-se de si mesmo - transforma-se em taxa de indexação: voa pelas linhas desertas quem reconhece  a emoção nos sentidos, os sentidos sentidos,  e o amor que nada tem a ver com qualquer deles. Ou tem, desde que não se pague a transferência de caixa torácica para o lugar mais acessível aos índices de nossa estagnação. Classificam-se emoções...
                    Olhos fechados grudam-se sob o peso da poeira: poeira é depósito de memórias nas vias cujo pedágio é lucro sem outorga.
                         Vai um sopro aí?

"Certas coisas se sentem com o coração. Deixa falar o teu coração, interroga os rostos, não escutes as línguas."
Umberto Eco


Ivane Laurete Perotti

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