LER OU LER
LIVROS
OU PELÍCULAS: JORGE AMADO SOB ENCOMENDA
_ entre ler e ler: o livro ou a televisão? –
Os
contornos do mundo indizível povoam o imaginário humano e revestem-se de
sentimentos. As emoções penetram para além das palavras aceitas e instauram
formas, cores, intensidade e contexto nos recônditos da alma pulsante. "Bilros"
tramam "rendas" entremeando palavras cruas e expõem o bojo dos pontos
amarrados em si mesmos. A palavra transporta-se em linha pelo fuso da
criação.
Nos movimentos das letras
tecidas desenha-se o não dito, o desejado dizer, o não expresso, o impregnado
de sentidos encarcerados sob as pedras da censura e da intolerância. Desejar é
próprio da natureza humana, criar imagens do desejo inconfesso é obra dos
rendeiros das palavras. Daí alçar Jorge Amado para o terreno dos
"sentidos", das imagens, das análises freudianas, das novelas escritas,
encenadas e coloridas pelas nuanças do cotidiano dramático e comum ao homem,
confere apenas "uma" leitura entre tantas outras leituras possíveis
sobre a obra do romancista baiano.
As discussões sobre os
gêneros textuais ainda transcorrem em terrenos férteis: limites e fronteiras
acerca da estrutura e da formação discursiva incluem performances que transitam
entre o signo e a forma, entre o ficcional e o real. Para além das
considerações e tipologias textuais há de se aventar acerca do
"gosto", da "fruição", do "prazer" que
personificam o universo particular e impreciso da experiência do
"leitor", do "espectador", com um conhecimento
enciclopédico capaz de movê-lo, ou não, pelas dimensões da obra manifesta
signicamente.
Dos livros para as telas:
é possível "pensar" o sucesso da literatura de Jorge Amado também na
televisão? Mesmo que se negue a imprecisão do prazer implícito que emerge das
"impressões de verdade" e verossimilhanças que o escritor constrói enquanto
narra, valendo-se de recursos de intertextualidade, do registro de variações
linguísticas, da construção de uma identidade baiana não restrita nem fixa,
quem "lê" Jorge Amado acompanha o desnudamento de histórias muito
próximas. Tanto no tempo histórico quanto nas dimensões psicológicas e sociais,
o ato de narrar do Grande Rendeiro
personifica um universo subjetivo de transferências. Não é a identidade baiana
que vai crescendo com um instrumento de análise, ao contrário, cresce na obra
amadiana uma identidade nacional, peculiar, reconhecível, palpável, possível. A
potência da literatura de Jorge Amado está na atemporalidade transponível
marcada pelas disjunções temporais: o tempo, mesmo que indicado, não remete ao
recorte histórico de fatos rememoráveis, mas sim, indicializa as possibilidades
do devir, do possível, do verossímil, do posto
e adequado modo de refratar o comum e o conhecido.
Jorge Amado é um exímio
contador de histórias. Não só! Contar de modo a abafar a voz de quem conta exponenciando
a história é arte em sua própria essência. Então, independente do gênero em que
se transpõe o universo criado por Jorge amado, a história em si mesma
transborda para fora da moldura estrutural em que se apresenta. Televisão? Um
útero plasmático fecundo e promissor para a arte de fazer arte. Livro? Um lugar de “fazimento” onde a arte assume o
núcleo da vida criativa.
O olhar enviesado para a
"roteirização" da literatura escrita, muito comum entre críticos da
contemporaneidade, mostra-se inócuo diante do sucesso de Jorge Amado. A
televisão empobrece? Quando a história é suficientemente rica para manter-se produtiva
no universo criador que implica: não! Pode ser?
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