ESTAMOS EM GUERRA
GUERRA
SURDA
-
caricatura de uma modernidade funesta -
“Ninguém ganhou a última guerra
nem ninguém
ganhará a próxima.”
Eleanor Roosevelt
Houve um tempo não muito
distante deste em que o comportamento
humano quase permitia uma compreensão motivada pelos conceitos
pertinentes ao seu entorno, à sua gênese, às suas raízes. De leitura em
leitura, as escolas de pensamento científico fundamentavam-se em estudos de
casos, observação direta, comparações, deduções entre outras metodologias
próprias para construir um paradigma antropológico com objeto delimitado. A
história oferecia um bom molde para ensinar-nos sobre o avanço da civilidade. No
tempo que focalizo, agora, os contornos desse objeto desvanecem, perdem o
tônus, ou, simplesmente preparam o esboço de uma caricatura nocente, infesta. Quem
é o homem atual? Que natureza bélica é esta que conduz a humanidade por sendas
de infinda destruição?
Não se
traduz uma guerra a partir da posição numérica das armas apontadas, nem dos
corpos exangues amontoados em calçadas
sanguinolentas, nem do medo em brasa derretido nos olhos das crianças
refugiadas. Guerras não são traduzíveis, simplesmente porque o seu escopo
conceitual não pertence ao possível semântico ou ao aceitável lexical. Qualquer
guerra é inenarrável. Os horrores criados pelo homem desumanizado não são
passíveis de descrição suficiente. Nem são audíveis, mesmo diante de quadros
que imprimem a escuridão na alma dos que sobrevivem de longe, felicitando-se
por não retumbar em sua vida rotineira, a conflagração mortal. Não! Alcovitados,
não planejamos participar da batalha, crentes de que nos basta cumprir o papel
de intermediários da paz. Não basta! A paz exige participação, movimento, postura,
ação, vontade política, educação para a vida, noções mínimas de direito às
diferenças culturais, étnicas, religiosas. A humanidade se desfaz diante de
nossos olhos em surda cadência de expansão.
Estamos em
guerra permanente sem demérito da retórica que ronda a frase. Só ronda! A
guerra isola e destrói, afasta e degenera, quebra a corrente da vida que se
deteriora sem fecundar os frutos guardados em seu bojo. Há uma guerra
acontecendo agora, aqui, lá, em qualquer lugar onde um, ou mais de um ser
humano se encontra. Despertamos para guerras gratuitas, localizadas,
menosprezadas pela dimensão das perdas materiais e aviltantes pela perda
indiscriminada do ser humano. A pólis, as poleis permanecem em pé,
materialmente, é o cidadão que desaparece quedado diante da força massacrante
da violência fria O oriente banha-se em sangue, mas o Brasil, sem mísseis em riste, mergulha em surda guerra caricaturada em
quadros de rotineira alarvaria: é a guerra sem fronteiras vestida de
bestialidades inconfessas.
Apaga-se o
cidadão brasileiro nas trincheiras sociais. Nenhum grito? Todas as dores se
fecham em concha e ainda suspiramos
comiserados diante da luta armada
que acontece em outros territórios.
A
guerra surda que assola a raça humana tem preço cobrado de geração em geração.
Não estamos a salvo nem aqui, nem lá.
Não existem ilhas de segurança nesse compasso, apenas o retumbar ensurdecido
dos corpos que tombam sob um tipo de maldade, crueldade, atrocidade que ganha ares de comportamento bestial:
D-E-S-U-M-A-N-O!
Estamos
em guerra!
Texto: Ivane Laurete Perotti
Texto: Ivane Laurete Perotti