UM TRIBUTO
AS
ESTRELAS SÃO MINHAS
- um tributo ao olhar iluminado -
"A noite acendeu as estrelas porque tinha medo da própria escuridão."
Mário Quintana
Sob
camadas de pó, a memória perde o brilho, o viço e a validade. Espanando-se os
fatos da vida, algumas janelas abrem caminho para os sentimentos instintivos e
primordiais que, latentes, morrem à míngua na ilusão do esquecimento. Quando
não são antecipadamente massacrados pela ansiedade das resoluções mágicas, ou da
desesperança não caridosa, autoflagelo imposto e aceito sem declinações.
Não
se aprende sem esquecer que esquecer é um jeito de aprender a lembrar.
Selecionar lembranças pode disciplinar o olhar sobre as escuridões temporárias
e os excessos de luminosidade tangenciados pelos milagrosos reveses da vida. Um
passo aqui, outro lá. Apagam-se os passos e permanecem as marcas no terreno da
alma consciente quando a alma está presente. E de presente em presente, até a
alma se faz ausente! Purga as decisões e sofre no ocaso dos sentidos que
atravessam o horizonte desalinhado.
Há sempre uma medida balizando a nossa forma de ver e
sentir: pesa a pena sobre a pele desnuda, queima a luz que se distancia da vela
acesa. Tocam-se as estrelas cadentes em pedidos rasgados diante da lua cativa,
ambígua e afônica. Salve Jorge! que sejam consumidos os dragões da ofensa e do malquerer. Sob espadas de magnólias,
revista-se a armadura do chão celeste, emblema campestre para os atentos peões.
Estrelas fecundam
a espiralada via láctea. Os dias escondem o rosto, a noite desdobra a manta e o firmamento parece estar sempre onde tudo começou, mesmo ao término dos
calendários com suas colheitas orquestradas. É assim: sentir, medir e guardar
processam-se no mesmo ritmo sazonal das emoções perfiladas em míticos
acontecimentos. De cá, de lá, somos andarilhos sob estrelas pontiagudas, fúlgidos astros de destino providenciado
pelas leis da vida, sempre ela, a manter-se ativa até quando a entendemos
perdida.
Vacância
entre os homens de bem. As estrelas são minhas, suas e de todos aqueles que
suspendem o ritmo para atear-lhes o fogo da poesia. Nutridas pela esperança,
não tardam em esmorecer, apagar, para voltar acender em outros sistemas, longe
dos olhos descrentes, céticos e apressados.
A noite não
cai... ela desce as estrelas para presentear a escuridão.
As estrelas não
morrem, mudam de lugar! E nascem da gestação orbital de nossos anseios: uma
forma de estar no mundo!
"Eu vos digo:
Alguém precisa ter caos em si mesmo
Para dar luz a uma estrela dançante."
Alguém precisa ter caos em si mesmo
Para dar luz a uma estrela dançante."
Nietzsche
Texto: Ivane Laurete Perotti
Texto: Ivane Laurete Perotti