AOS DOUTORES DA SIMPLICIDADE
GRADUADOS
PELA VIDA
-
especialistas em sábia simplicidade –
“Que ninguém se engane,
só se consegue a simplicidade através de muito trabalho.” Clarice Lispector
A
ignorância linguística e a estúpida boçalidade de um especialista clínico
atravessaram as redes sociais nessa última semana. Verdade ou não, o tema é
fidedigno ao cotidiano da soberba e não representa a classe médica – há de se lembrar
que os especialistas da saúde cuidam do corpo e da mente, da alma e do que quer
que esteja vinculado ao universo da subjetividade humana – será? Só para
lembrar, outra vez, a cura é um trabalho
em conjunto e não exime o paciente de seu lugar de sujeito ativo, apesar das fóbicas
distâncias que, infelizmente, instalam-se em muitos ambulatórios de atendimento
clínico, assépticos de honrosa humanidade. O rodeio desta contextualização serve
para terapizar a indignação diante do ocorrido, tenha se dado ele na ficção ou
na realidade. Confesso que não sei é possível baixar o nível do desprezo gerado
pela cena: dois homens em um lugar de legitimidade do socorro, do cuidado,
sendo que apenas UM DELES TINHA CIÊNCIA SOBRE A MECÂNICA DA VIDA. Pena! Apenas
um deles...
Riram os
profissionais envolvidos no que foi considerado erro de linguagem? Pois, riamos
nós, da profunda ignorância linguística desses nativos de Língua
Portuguesa Brasileira formados em saúde - sic!sic!sic! - e aplaudamos a genial
capacidade do senhor letrado, mecânico de profissão, em gerar comunicabilidade.
“A simplicidade é o último grau de
sofisticação.” (Leonardo Da Vinci) Pois, aí vai: primeiro, a língua escrita
e a língua oral são duas. Fala-se diferentemente do que se escreve. Segundo, /pneumonia/,
vem do grego /pneumon/ “pulmão”, acrescida do sufixo -IA, usado para caracterizar doença.
Terceiro, /peleumonia/ vem do regionalismo sadio acrescido da lei de menor
esforço, típica do momento da fala, agregada por justaposição ao constrangimento
pela exposição diante de um DOUTOR DA VIDA, somada ao comum radical da timidez
do povo na legitimação de um interlocutor SUPERIOR EM LETRAS – sic! sic! sic! –
e, pela fonética que explica o ambiente
articulado de uma plosiva oclusiva bilabial /p/ (conforme o International
Phonetic Alphabet) em environment de
CCV, de acordo com Joaquim Matoso Câmara Júnior. Quarto, pelo dever de cuidado,
eu gostaria que se “tirasse a pressão” semântica dos demais envolvidos, a fim
de explicar-lhes que, mais uma vez, o riso é nosso diante da estulta e covarde gafe lexical. /Tirar a pressão/ , por
convenção social, equipara-se a /tomar um ônibus/, ao invés de /bebê-lo com
canudinho/; a /tomar um banho/, ao invés de abocanhar a água do chuveiro. Se
bem que, talvez seja essa a semântica de enunciação que decorre da ignorância
acadêmica - sic!sic!sic! - dos profissionais que protagonizaram
a delonga da cena enunciativa em comentários agregados ao exposto pelo primeiro
delatante do erro . Então: Sô dotô, imagini si ocê pricisá operá o mutô
du carru e faiá as ferramenta?Prá mais di bão qui le socorro...cum certeza!“Feliz
aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina.” (Cora Coralina)
Infeliz o que carrega um diploma nas ventas e espaia opróbio. A ignorância começa na alma e se espalha pelo
coração : o sangue da arrogância obstrui as cavidades por onde deveria fluir o natural
respeito pela diversidade. E ainda, em se tratando de diversidade, é o que mais
se retrata em falando de línguas naturais.
Quem sabe, devêssemos prescrever uma
receita de tratamento contínuo para os profissionais sem ética nem poética:
aplicação intravenosa de respeito humano ad
eternum.O saber a gente aprende com os
mestres e os livros. A sabedoria se aprende é com a vida e com os humildes.
(Cora Coralina)
ESTE TEXTO É UMA
HOMENAGEM AO DOUTOR EM COMUNICAÇÃO QUE NÃO SE CALOU DIANTE DA DOR E DE UM
IMPOSTOR DAS CIÊNCIAS HUMANAS.
Ivane Laurete Perotti