EM NOME DE QUEM?
DEUS
É ATEU
-
em existindo um Deus, certamente ele não tem religião -
"...talvez
a maior tragédia da história da humanidade tenha sido o sequestro da moralidade
pela religião."
( Arthur Clarke)
Ajoelhada aos pés da
humanidade, a sombra de escombros futuros tergiversava: pisar sobre si mesma
parecia-lhe sacrílego. Uma sombra entre tantas outras sombras desgarradas de
suas categorias históricas. Nomeava-se no oblíquo das verbalizações perdidas e
clamava pelo vão entre os mundos presentificados.
Significados
indecifráveis permeavam a sombra com nesgas de anima e animus. A natureza
da sombra retorcia-se no espelho das
análises; bordejava à compreensão da persona
- aspecto consciente da personalidade humana -, o que fazia de Jung um Carl a mais, apenas mais um na cadeia
das possibilidades analíticas. De quais sombras nutria-se o homem atual?
Fletida, a alquebrada sombra gemia as dores da
antevisão : “Minha fé é no desconhecido,
em tudo que não podemos compreender por meio da razão. Creio que o que está
acima do nosso entendimento é apenas um fato em outras dimensões e que no reino
do desconhecido há uma infinita reserva de poder..."( Charles Chaplin).
Os joelhos inexistentes da sombra formavam um ângulo piedoso na região escura
de sua extensão. Projetada pela existência de vários obstáculos, anunciava a
ausência parcial de luz em um perímetro subjetivo e inalcançável. Talvez negociável, não fossem as sombras quentes
do sangue derramado em Daca/Bangladesh, em Istambul/Turquia, em Cabul/Afeganistão,
em Bagdá/Iraque, no Quênia /África Oriental e em tantos outros territórios
civilizadamente religiosos. "Cada
homem que morre é uma morte de Deus. E quando o último homem morrer, Deus não
ressuscitará." (Saramago)
Fletida, deixava passar ao largo os desejos de
compreensão: "Como, homens com
Deus podem ser tão maus?" (Saramago).
Dos poros
metafísicos da sombra gotejavam medos: tristezas transformadas em insegura
realidade. Onde estava Deus? “Deus deseja
prevenir o mal, mas não é capaz? Então não é onipotente. É capaz, mas não
deseja? Então é malevolente. É capaz e deseja? Então por que o mal existe? Não
é capaz e nem deseja? Então por que lhe chamamos Deus?” (Epicuro) Vozes
difusas diziam de si e do intangível: teístas, ateístas, agnósticos,
crédulos... partidários da presença de Deus, abandonados, devotos à crença de
múltiplos panteões divinos, todos , absolutamente todos, em guerra sangrenta: "...mais fácil imaginar um mundo sem
criador do que um criador carregado com as contradições do mundo." (
Simone de Beauvoir)
À sombra, como se fosse dela,
recaíam as responsabilidades. À ciência, como se fosse ela, a razão das
improbidades: "A ciência humana de
maneira nenhuma nega a existência de Deus. Quando considero quantas e quão
maravilhosas coisas o homem compreende, pesquisa e consegue realizar, então
reconheço claramente que o espírito humano é obra de Deus, e a mais notável.”(Galileu
Galilei)
Seria Deus, um
péssimo criador? Ou, cansado, talvez deixava ao homem o seu maior legado: a
liberdade de ser !
A sombra antevia e via sem
anunciar:"Dentro de nós há uma coisa
que não tem nome, essa coisa é o que somos." (Saramago)
Ivane Laurete Perotti