PELO BEM QUE NADA TEM
A
POESIA QUE NOS SUSTENTA
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sem propósitos deliberados, a poesia esconde sentimentos –
“Fossem
meus os tecidos bordados dos céus,/Ornamentados com luz dourada e prateada,/Os
azuis e negros e pálidos tecidos/Da noite, da luz e da meia-luz,/Os estenderia
sob os teus pés...”
William
Butler Yeats
Descansar da
vida é um desejo. Querer um amor, uma necessidade. Viver o tempo da tristeza, uma obrigação.
Garimpar a felicidade, um propósito. Deixar morrer as certezas, uma
consequência do estar no mundo. Assim se desdobra a consciência do homem vivo: uma
linha de sentimentos viajantes no tempo e na esfera das emoções.
No descanso da vida, a
vida bate à porta da inconstância. O aríete da incompletude chama de volta
tantas vezes quanto os olhos fecham as taramelas da visão.
No desejo do amor, a necessidade cria
ilusões de poder e submissão: nenhuma compreensão da natureza livre do
pertencimento.
O tempo da tristeza não paga
aluguel. Inquilinos sombrios apossam-se de espaços entulhados pela culpa, perda,
afastamento, e solidão. Insistentes, os moradores indesejados criam apegos e
desativam os sentidos do deixar ir. Constroem a eternidade da morte em vida.
Garimpeiros da
felicidade trocam moedas, títulos e heranças do saber, ter, sentir e alcançar.
Acionistas da diversidade creditam ao destino o estado de júbilo. Investidores
das causas pessoais assinam declarações de gozo em parcelas de emoções dúbias.
Descrentes jogam à sorte o arbítrio da satisfação. Solitários plantam rosas.
Poetas servem no prato das linguagens as frações do contentamento. Os céticos descartam
a euforia que lhes chega sem avisar.
As certezas morrem aos pés da sabedoria,
mas ao seu funeral não comparecem os interessados.
Vivem
e morrem os homens nas frentes de batalha pelo “agora”: inalcançável momento de
eternidade.
Sobrevive a
poesia no descanso da vida, útero fecundo para os embriões das emoções.
Estou grávida de versos imaturos...
Ivane Laurete Perotti
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