A BOBIFICAÇÃO DO CONSUMIDOR

BÔNUS VIDA
  - ganha quem perde sem esperar -
                
" Um poema como um gole d'água bebido no escuro..."
       Mário Quintana

                                     E dizem que se aferra ao medo aquele que o desconhece temporal e passageiro. Todo o medo é passageiro? Tremores líquidos não configuram inundação, se bem que poderiam, em nome das chuvas perdidas, não vindas, escassas, birrentas chuvas que não deságuam esperança sobre o leito do Chico.
                                     Espreme-se o Chico, aspira-se o fundo da Cantareira, espalha-se uma preocupação tardia pelos quartos hídricos da população ansiosa. Em quanto tempo  a chuva vem? Não vem! Vai? Talvez passe depressa demais, deixando às torneiras secas o trabalho de balançar as brilhantes teias das aranhas criativas. Gangorras de necessidade e apreensão instalam precárias caixas de armazenamento: a economia dita o verbo, impõe a flexão, indica o ponto final. Gritar, agora, só para conscientizar acerca dos imperiosos fatos: a água é um recurso natural esgotável!
                                     Aumentam as interjeições sem papas homográficas: todo o som vale a pena quando a água é um problema. É! Não exatamente a água, mas a proporção de nossa deseducação frente ao meio que bonifica a vida. A hidrosfera abunda na manutenção de sistemas inteiros: /abunda/, /abundou/, /abundará/, caso nossos gulosos  olhos batam as pestanas em continência consciente. O Planeta Água resseca os lábios em concha aberta: quem se habilita a contestar a histeria?
                                     Sim, de toda a  água, em várias formas e lugares do planeta, menos de 0,02% está disponível em rios, lagos e lagoas perfazendo um contingente de água fresca, consumível. Alarmismo ou estratégias de venda? Com certeza, um pouco do que se vê, muito do que não se sabe e excessivamente o que se desvaloriza enquanto atitude ecológica: a água é resultante do Ciclo Hidrológico, e parece inesgotável, parece... por que contaminá-la, poluí-la? Esgotadas as possibilidades de reutilização, esgotam-se os bônus creditados pela ação da científica criatividade humana. O mau gerenciamento da água é aposta política em um pé só. Mancando, mancando, mancando, faz-se a dança da chuva para enganar a torcida contrária, para agradar aos investidores e calar a boca dos consumidores. Consumidores bonificados, bobificados,  responsabilizados em/pela cadeia natural: de quem é a culpa pela escassez  d'água em várias regiões do país? São Pedro não mandou resposta, Santo Antônio recolheu-se ao frescor do último banho ( dizem algumas culturas brasileiras que molhar o santo casamenteiro é chuva na certa. Cadê as moças casadoiras? ) e São Cristóvão resolveu atravessar outros rios, dando preferência àqueles que ainda têm água.
                              Enquanto isso, vale lembrar que nem só de economia salvar-se-á o banho nosso de todos os dias. Na outra ponta do  perrengue, alguém lucra, engarrafa e multiplica para além dos invólucros e dos caminhões-pipa: robustos tanques da esperança líquida.
                              Dúvidas?
                              Disque água! Educação e gerenciamento demoram...demoram...

" Quem quiser permanecer limpo entre os homens deve aprender   a banhar-se em água suja..."

      Nietzsche

Texto: Ivane Laurete Perotti

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