QUANDO AMAR NÃO É PECADO
- nas bordas do abismo há mãos e lobos: sem amor,
as mãos criam dentes -
"Não acabarão nunca com o amor,
nem as rusgas, nem a distância.
Está provado, pensado, verificado.
Aqui levanto solene minha estrofe de mil dedos
e faço o juramento: Amo firme, fiel e verdadeiramente."
Está provado, pensado, verificado.
Aqui levanto solene minha estrofe de mil dedos
e faço o juramento: Amo firme, fiel e verdadeiramente."
Vladimir Maiakóvski
Algoritmo
da lógica fria, quem diria: amar não é
pecado!
No brilho
hipócrita e ofuscante das tagarelices humanas reside a ambígua inconsistência
das instruções que brotam do ego doente: a conquista do paraíso arde em chamas
de intransigência e fealdade. Inflexíveis, marcham homens e dogmas no uníssono
engano das verdades nominadas. Cai por terra o direito à liberdade ampliada
pelo céu de todos nós. Todos: pronome indefinido alocado na sintaxe da
generalização e dos conceitos pré-estabelecidos. Conceituar antes é julgar com ônus e danos
irreparáveis: contraste da evolução modernosa...
caverna das almas rotas, avanço do fundamentalismo, progresso das obsessões
embrulhadas em literalidade concupiscente. Como se, literal,
fosse uma possibilidade real, e real,
fosse uma verdade tangível! Obscenos sentidos lambidos pela ignorância dos
empedernidos. As pedras falam, não vociferam e sequer se negam ao fustigo dos
ventos: as pedras aceitam a intrigante mudança na permanência de um lugar.
Lugar: espaço ocupado pelo corpo de uma ideia. Ideia: ação promovida pela
inteligência invisível e provável, tão palpável
quanto o corpo de uma pedra.
Na
parelha dos assombros, alguns ombros... poucos, para o peso do calvário criado
e imposto à massa sem direção. Da seguridade desfalcada à crise administrada (
elaborada em petas, lorotas, potocas, embromações, figuras hirsutas dos discursos cuti-cutis
- sem alusões sonoras, ou com elas e todos os demais respingos fônicos que a semântica da ironia tornam indigestas:
festa das siglas e das enganações - registram uma história elucidativa, puída por traças e braços de criminalidade instituída)
vamos agregando tribos, armando grupos moldados em argumentos e convicções. Assombrosas
páginas de subversão. Farrapos ideológicos manchados no silêncio e na denegação.
Ignobilis modernidade portentosa: a quem enganam os que
levantam a cana? Vara torta tem ponta
curta e diz a matemática das pressões que a equação se volta sobre a origem da força empregada:
militância estrepitosa, perigosa operação.
Mãos criam dentes
e rasgam no berço nascituro o amor que há de nascer. Há? Antes de vir à luz,
que se creia no movimento, mesmo lento, da singular necessidade de deixar vir e viver o sentimento da igualdade, premissa de bondade, combate à
iniquidade, receita de paz: sensatez!
Que a banalidade não erija
morada nas linhas dos nossos dias, tão curtos, tão poucos, tão soltos e sem razão.
Normal é amar sem medo, sem peso no coração. Doente é o amor apenado
nas roldanas de grilhões, cadeia de desculpas
estropiadas à guisa de controle, ausência de vocação.
Amar não é
pecado!
"O coração tem domicílio no peito.
Comigo a anatomia ficou louca.
Sou todo coração."
Comigo a anatomia ficou louca.
Sou todo coração."
Vladimir Maiakóvski
Ivane Laurete Perotti