AINDA SOBRE O AMOR... E AS BICICLETAS!
PARA
NÃO DIZER QUE NÃO QUE NÃO FALEI DO AMOR (parte III):
“Entre
casar e comprar uma bicicleta...”
(adágio popular)
Perdeu-se no tempo a pergunta indireta.
Além das bicicletas ganharem novos modelos, o casamento também assumiu
nupérrimos perfis e, quem casa, divorcia-se.
Bem mais fácil do que comprar uma bicicleta, a depender da marca e dos
acessórios que a acompanham. Por falar em acessórios, os veículos de duas rodas
mantêm um vínculo estreito para com as metáforas da vida a dois: a tipologia é extensa e agrega-se aos contextos de
acordo com as suas implicaturas. Implicância! É, parece implicância de minha
parte fustigar um assunto tão delicado quanto vergastado. Impróprio para as páginas
de um jornal. Talvez! Mas a maré do amadurecimento aponta o lume para direções
nem tão simples quanto casar ou
comprar uma bike.
Dubito, ergo cogito,
ergo sum!
Descartes teria uma bicicleta? Um celerífero?
Possível, se relacionarmos as prováveis notações históricas para a invenção do
veículo tracionado, mas antes dela, da bicicleta, o casamento já se enquadrava
nas aspirações pessoais e no rol das imposições sociais. Tradição, cultura,
preservação de patrimônios, manipulações políticas, interesses de estado,
tratados de paz, concepções religiosas entre outros processos maquinados pelas
relações humanas, selavam-se na presença do sim,
do para sempre, e até que a morte nos separe. Quando os sentimentos suplantavam as
circunstâncias, na vida e na literatura – a vida é uma via de mão dupla, a
literatura apenas redescobre corredores paralelos à estrada principal - o amor alçava status dramáticos. Não muito
diferente da contemporânea mobilidade amorosa com a qual convivemos agora.
Mobilidade, eis a fonte das conjugações verbais para o termo casar-amar, amar-casar, amar-ficar... ficar-casar...
O casamento não é uma escolha
com passe livre. Poucos nascem com a faculdade deliberativa que ensaia o
amadurecimento do ato ou para o ato.
Aprende-se uma vez a andar de bicicleta e a máxima estende-se a todos os
modelos: duas rodas, pedais, quadro de estabilidade, correias... estabilidade!
Ah! Estabilidade: a estrada dos casamentos parece correr longe do ensejo.
Quanto mais vezes casam-se os indivíduos, menor a capacidade de manter-se sobre
o cilindro da segurança? Que segurança?
A escola da vida poderia
criar uma disciplina metodologicamente amparada pelos fundamentos de nossas
histórias pessoais. Seria, certamente, um grande investimento cooperativo para
a sustentabilidade das núpcias contraídas na fogueira das emoções – ou sentimentos,
ou desejos, ou intenções. Paradigmas a parte, casar estaria, com efeito, para o exercício consciente da conquista do outro, do cuidado para com o outro, do respeito às inevitáveis (e saudáveis)
diferenças do outro, do querer o
outro. A ambiguidade das palavras envolvidas devolve-me o discurso que
entrelaço a sovéu curto: quem é o outro?
Aquele que está dentro ou aquele que está fora? Dentro e fora me desmentem peremptoriamente. Ousadia
verbal ou necessidade de confrontação? Os dois! Por que não? Pensar e duvidar
não foram prerrogativas do grande filósofo e matemático francês, nem a
introdução “Era uma vez uma princesa...”
conferem verossimilhança entre a vida e a literatura. Os finais felizes estão
marcados pela trajetória da corrida no início de sua largada. O casamento não é
uma instituição falida, nós – os envolvidos
- esquecemo-nos de perguntar a que viemos: casar ou comprar uma bicicleta? Os
dois, para quem tem fôlego e disciplina!
Saecula... amen !
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